Não quero mais perder tempo com a melancolia do amor distante, hermenêutica de poemas concretistas ou qualquer vestígio de retórica (no sentido pejorativo). Isto, que é o ganha pão dos contemporâneos, é uma leseira mais arcaica que o pentelho da múmia de um faraó.
Certa vez, peguei emprestado de uma dessas bibliotecas que ficam em repartições públicas um exemplar de “ Os sofrimentos do jovem Werther”. Fiquei contente, afinal, estava prestes a ler o autor que, pelo o que a internet fala (a qual não devemos dar muita atenção), Goethe tinha um Qi altíssimo; com isso, pensei: “ bati as paradas’”.
(Devaneio infantil. Devaneio de quem não pensava por si só.)
Peguei o exemplar, comecei a ler e não aguentei 50 páginas —e olha que insisti bastante. Não aguentava mais aquela descrição epistolar de Charlotte como uma camponesa gentil que cuidava de crianças e brincava com elas.
E o tal do Goethe é tão pomposo que ainda soltou uma frase mais ou menos assim: “se o seu poema não for perfeito, é melhor nem fazê-lo”. Acho que uma conversa sincera consigo mesmo diante do espelho ajudaria em muita coisa.
E, outro ponto, eu criei uma obsessão por algo que seja bem conciso e que o final seja desastroso. (Julguem-me, mas isso não tem nada a ver com minha personalidade; afinal, se alguém olhar de cara feia para mim, já ataca a gastrite). Deve ser por este motivo que eu criei uma feição por Shakespeare e Sófocles, mas mais ainda pelo Bardo.
Há meses atrás, eu queria ser Shakespeare, tanto que queria colocar pequenas argolas nas orelhas para ficar igualzinho a como ele é retratado em alguns quadros.
E, adentrando no enredo dele, conheci Hamlet, o príncipe da Dinamarca. Achei esdrúxula a cena que ele retira os ossos do bobo e tateia seu crânio —porém, é do esdrúxulo que eu gosto. Hamlet era eu, louco em alguns momentos e são em outros; assim como Macbeth —se me dessem poder, acho que eu terminaria como ele.
Penso que eu esteja vivenciando uma nova teoria da psicanálise: se transformar naquilo que você odeia. Por isso, acho que estou me transformando em um clássico literário brasileiro, ou seja, um completo chato.
Por Pedro Figueiredo
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O chato na literatura - Por Pedro Figueiredo
Reviewed by Redação
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19.5.21
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