Análise das espécies em um dia de trabalho - Por Pedro Figueiredo - DIÁRIO PATOENSE

Análise das espécies em um dia de trabalho - Por Pedro Figueiredo


Manhã. Mais um dia de trabalho. O céu amanhece cinza, combinando com o olhar do povo. Aliás, é mais uma semana de trabalho; longe do estimado gozo da aposentadoria. 

Na sala do trabalho, há tantos transeuntes como a Sólon de Lucena em horário de pico. Mas, possui uma diferença: não há o ruído do centro da cidade. Os trabalhadores, agora, repletos de júbilo são chamados de “colaboradores”.
 
Alguns criaram um vício, tão fatal como a cocaína, tão digno como o de estudar. O vício está no trabalho e, nunca, vi um viciado usar o entorpecente por pura felicidade; pode ser por gozo, mas é um gozo repleto de uma necessidade íntima. 

Já ouvi dizerem que não aguentam a mulher sendo chata no pé do ouvido, por isso, preferem passar o dia trabalhando, naquele deleite de papéis, computadores e calculadoras. Sendo o ósculo mais lascivo uma planilha “batida e conferida”, e a paixão mais ardente a conversa estúpida com os colegas de trabalho. 
 
As adúlteras e as salientes são um PF depois de um dia de jejum para eles. É um prazer que eles adquiriram por osmose, ou esse prazer é um vírus como o Ebola — quanto mais trabalha, mais sua, mais se espalha, mais se contrai.
 
Eu ainda prefiro essa raça, a da banalidade. Pois, de um outro lado, há os que tentam puxar um assunto intelectual no meio do expediente. Se esqueceram, por acaso, que meu prazer está na planilha “batida e conferida”? Mas, para não ser prolixo na catalogação dessas espécies, termino com a mais chata e entediante de todas: o extrovertido.

Atente-se ao processo do desenvolvimento da patologia (uma das poucas que se desenvolvem ao máximo em 10 minutos): primeiro, dá um “ bom dia”; segundo, pergunta se tudo está bem, e, até aí, eu respondo, pois sei que ele está perguntando quase que por uma obrigação da dialética brasileira. Porém, após isso, ele fica procurando cabelo em ovo: “ rapaz, você soube que fulano da Silva está com covid?” ou, pior ainda, “ O ex-presidente pagou a dívida externa, e você ainda é de direita?!”.

O problema não é a pergunta, pois, sempre que enveredam para esse caminho, sempre solto um sorriso de canto de boca ou um “rum”, para ele não se sentir ofendido para ficar sem resposta; mas o chato está em como foi feita a pergunta. 

E, após encarar essas megeras todo dia, toda idiotice e banalidade se torna comum, e acaba meu prazer na planilha, nos papéis para impressão... E eu termino sendo demitido. Enfim, de uma maneira ou de outra, quem se lasca sou eu. 
 
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Análise das espécies em um dia de trabalho - Por Pedro Figueiredo Análise das espécies em um dia de trabalho - Por Pedro Figueiredo Reviewed by Redação on 26.5.21 Rating: 5

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